2.9.12

Pedaços de Ama em mim - 1 parte





Cabelos alourados de sabor a mel, caramelizados em menta e manchados com tigelas de leite ensopados em chocolate cor de ramos desbotados pelos anos; Pele apimentada com molho de manga, pele com tons de terra deslavada, pele desfiada por um leve, mas refinado, tom amendoado; Andar preciso, definido; Olhar quebrado pelas dores do passado, mas tentado ao seu azul ainda em brisa, aliás era andante. Em seus lábios era trancado um vinho tinto exacto, único e apaixonante. Sentia-se o cheiro, o cheiro do Porto e quem me dera nunca o ter sentido, talvez o seu percurso mudasse, não sei! E a sua alma, bem, era desajeitadamente jovial, não! Não lhe faltava o sorriso, esse era o único exótico em que eu abismava o ferver do sangue.
Esta era a minha irmã, a Dina Amarela, mas todos a tratavam por Ama e não era somente por causa do nome.
Lá, no tempo que se acerca de mim, no tempo que me trespassa as rugas de hoje, cheirava a flor campestre, aquela que nasce amarela e morre acastanhada, cheirava, cheirava no dia em que ela partiu, a minha imã, garanto-vos, era tão intenso e intimo que posso senti-lo agora mesmo, como se ela nunca tivesse partido. Sinceramente acho que ela quis partir, mas nunca da nossa alma, mas creiam em mim, quem me dera que tivesse partido de vez, quem me dera não ter pedaços de Ama em mim.
Esse, o momento em que partiu, fora o tempo mais temeroso em toda a minha vida, esse e todo o tempo desde que as suas palavras sobre o que pretendia fazer chegaram aos meus ouvidos. Não estava habituada a perder parte de mim, talvez a maior e a melhor parte de mim, mas perdi, eu e toda a gente que habita esta aldeia. Perdemos o amor em nós, deixamo-lo ir sem renegar a sua ida, desejando-o arduamente na altura, mas por fim quebramos esse desejo entregando-nos a uma frieza amena, delicada, sente-la? 
Um chá de morango, três tostas com doce de abóbora e canela, um beijo na testa e duas palavras: boa noite ou bom dia, era tudo o que ela desejava no início e no fim de mais um dia. No seu dia ela não o desejou, pelo menos de manhã, porque de noite já lá não estava, isso é certo. E se de noite o desejou é porque se arrependeu da sua ida e eu que a conheço em retalhos, duvido, sou franca, não se arrependeu, deixou-se amar o vento de si. Aquele de quem eu e todos nós sentimos falta em excesso, aquele que nos faz resfriar os poros da pele na sua ausência.

(Continua)