18.6.12

Voltei? - 5 Parte


(continuação)
-Hospital de S.João, por favor.
Chegara, mas o seu corpo sentia-se como um barco que embatia contra a maré impedindo-se de sobrevoar as suas águas, mas a maré embatia com mais força nela, forçando-a a sair do táxi e estatuar-se à porta do Hospital.
Ela era então estátua, que não se quebrava com a passagem do tempo; podiam-se passar sucessivos anos, que a força da pedra com que fora construída nunca se decompunha: mas os estratos, a cor perdida, as ervas daninha, as manchas, aparentemente lixiviadas, apareciam, e ela não queria ter a eternização de estatuária em seu corpo, pois podia não viver eternamente, mas o tempo que vivia era real. Andou então em direção ao Hospital e em pé, esperou que as letras do seu nome fossem pronunciadas.  
O seu coração estava nulo, impedindo a passagem de mais sangue para este, o seu corpo era como uma folha branca, nada batia certo, pois nada existia, e o seu rosto? Era como um dia nublado, as cores existiam, a esperança de encontrar a luz habitava, mas o caminho continuava escuro, inabitável, gris. É claro que ela sabia a resposta, mas se não tentasse a fiabilidade esta morreria junto com a sua vida, e isso ela não queria, pois ela nunca tentara ser única ou especial, apenas tentara na constante do tempo, sempre, ser viva, real.
O seu nome foi pronunciado de forma insípida, sem sal, sem açúcar; deixando-a contar o movimento que em passos meramente apressurados digitava no ar, conjuntado, em direção a sala mencionada. E sentou-se. Sentou-se esperando pelas várias sensações que vivera atrás, num só dia, esperando que estas voltassem, mas não voltavam; ela sentia-se então, irrita, invalida, cinzenta e branca, como a sala que diante de si estava.
O médico entrou, a sensação não mudara. O médico passou por ela, a sensação permanecia. O médico tocou-lhe no ombro, a sensação tornara-se arrepiante, mas igualável. O médico sentou-se e percorreu-lhe o olhar, com lástima, porventura, e a sensação refrescou-lhe as ideias, sendo perseverante. 
Recordo-me agora que naquele momento ela lembrou-se do dia em que fora à praia pela primeira vez, pois nesse dia, sentada na areia cortante e gélida, propicia de uma tarde de outono, viu o reflexo das memórias mais importantes da vida dela, no mar. O reflexo de uma vida, frente a ela, mencionado na ondulação vibratória da força do mar, porque tal como ele: ela conjuga-se num sempre, num sempre indefinido pelo tempo.  

(Continua)