(continuação)
A falta de palavras, a falta de frases
enquadradas nos sentidos de compaixão, a falta de carácter incumbido em
sentimentos e a falta de pensamento no outro, já era um procedimento habitual
nos médicos daquela altura, portanto ela recebera a notícia da pior maneira
possível:
-Minha cara, as análises estão feitas e tal
como eu mencionei na sua outra consulta, nada havia a fazer e de facto, nada há
a fazer, só tem três dias, três dias de vida. Desculpe, mas com este tipo de
cancros, a possibilidade de fazermos alguma coisa é impossível.
Agora. Agora. Agora. Acabou. Acabou. Acabou. O
tempo para si tinha parado, ela não conseguia pensar, ela não conseguia ouvir a
sua própria respiração, ela não conseguia ouvir as pessoas à sua volta, ela
sentia-se só, pela primeira vez na vida. Pois sabem? Ajudar os outros é fácil,
ajudar-se a si, quando nunca aprendido, quando nunca examinado, quando nunca buscado,
é impossível.
O pânico então sublevou-se e apoderou-se dela,
antecipando os três dias.
(Continua)