17.6.12

Voltei? - 4 Parte


(continuação)
Ali estava ela, ela e o dia, o dia e ela; ali estava ela, sentindo-se como a água que cai momentaneamente da fonte abaixo em gotas que se esborraçam umas nas outras enquanto embatem a superfície aquosa; ali estava ela sentindo-se como a chuva, a chuva pálida de inverno. Não era o seu nome que era guinchado por toda a gente que passava ao seu lado, não eram os olhares que lhe perseguiam a silhueta quebrada pelo tempo, não eram os sorrisos amorosos dos homens agradecidos que atravessavam a rua a seu lado, não eram as pessoas que viviam naquela cidade, não eram os olhares que se cruzavam com o seu a cada segundo, que lhe contavam os passos, que lhe pediam algo, não eram, não eram essas pessoas que a faziam suar, que a faziam deixar os seus pelos sublevarem-se, que apertavam o seu coração contra a parede do tórax como se este se subdividisse em varias partes por entre cada costela do seu corpo, não eram, não eram as pessoas, era ela mesma, e o medo. Ela mesma, e o medo, e o medo.
Ainda nem dois ossos do seu corpo se tinha mexido depois de sair, ainda nem dois passos tinha dado quando sentiu as badaladas da igreja baterem na sua mente fazendo-a ver que se encontrava a pensar, quase imóvel, algo que não queria, fazendo-a sentir então um saco quebrar a sua respiração, algo sufocante!
Quebrou aquele pensamento e deu o seu primeiro passo, de muitos que se seguia, sorrindo para a pessoa que tão desajeitada atravessava a estrada, por entre carros que buzinavam repetidamente, para a vir cumprimentar. O dia começara, o seu dia começara.
Estava ela a vaguear pela cidade do Porto, cidade está que palidamente nublada lhe encobria o caminho, deixando que o pó da manha sonolenta fizesse-a perder no mais íntimo de si, criando-lhe seguramente inseguridade quando ao dia que lhe esperava.
Mal se podia movimentar na estrada cisterna do seu caminho, outrora isso não a incomodará mas hoje a pressa era dona da perfeição, e ela não podia repudia-lo.
A cada passo que dava a jornada era curta: um, dois, mais um, mais dois, calma, calma, afinal vêm outro e depois outro, há! Mas antecedido por outro e outro…
Ela conhecia toda a gente que naquela morada se estacava, fosse alguém que incumbia palavras estranhas e falsas ou alguém de estatura desconhecida, mas com um rosto idêntico a milhares que já virá, pois ela era crente nas almas, e que em cada pessoa dormitava uma alma diferente.
O seu corpo não estava estável, queria sorrir e os seus lábios não abriam: sentia-os presos, inertes, frágeis; sentia-os como se um sedimento de resina fria os cobrisse, mas que lhe tendia a escaldar os cortes que neles numa outra ocasião fizera, rompendo-os friamente com os dentes. Pálida. Pela primeira vez, ninguém cumprimentou. Ninguém. Sentiu. Sentiu. Sentiu os olhares a persegui-la, mas apressou-se sem movimentar os olhos na direção objeta ao seu caminho, fingindo-se muda, surda e cega, até que, chegou à paragem dos táxis e afirmou: 

(Continua)