(continuação)
Ela era
Anita, Anita a senhora que nunca passava por alguém na rua sem lhe fazer um
gesto carinhoso, um gesto reconfortável ou mesmo um gesto que abrisse o sorriso
de alguém por meros segundos, mas cercava-se de si um dia muito importante, e
Anita, como em todos os dias, queria estar mais pacífica que uma tulipa: aquela
que nada com o vento cada vez que este a remexe, deixando o vento contar os
recantos da sua suavidade não permitindo que nestes se encontre frieza. Mas os seus
passos zumbiam cada vez que se aproximava da porta, zumbiam de tanto ardor que
expediam para o seu interior criando-lhe um forte formigueiro, mas ela querendo
ser tulipa, batia com cada um dos pés no chão para o formigueiro que se fazia,
desaparecer na instantaneidade do abalo.
Aproximando-se
então da porta, colocou as chaves, mas sentiu algo novo impedi-la, quebrando as
suas últimas e reservadas forças, forçando-a a não se mexer, forçando os seus
dedos a pararem; mas ela lutava contra essa pessoa frágil que por momentos se
aproximava dela, ela lutava contra essa pessoa pensativa que queria fazer parte
dela neste momento tão renovador, fazendo-a mudar de ideias. Mas ela lutava,
certificando-se do que é de facto ficar sem folego, pois ela queria mudar o que
era, mudar o que sentia, queria ser uma pessoa nova, alguém recentemente
antigo, mas vivo. Julgam que é fácil, mas não é tão fácil assim, e segura-la
ainda piorara a situação, pois as certezas do acabar se confirmaram e se ela
percorrer esta estrada o acabar é opção mas não certeza. Ela não tem como
fugir, por mais que queiramos que tenha, ela precisa e nós precisamos, ela sabe
o risco mas não tem escolha nem por onde escapar, então livremente deixe-mo-lá
voar, porque se o está a fazer é porque em algum lugar pensou que houvesse
esperança, então tenhamos também.
Finalmente
abriu a porta e saiu para a rua.
(continua)