(continuação)
Ela era nevoa: branca, esvoaçante,
tão rapidamente presente como aluada, mas era rigidamente inquebrável como um
muro, porque era aquele tipo de pessoa que aceitava o pacto do pensamento
primeiro no outro, depois em si.
Mais
um dia se cruzava com a sua alma. Ainda sonolenta, tentou despertar-se com a
luz que irradiava pelos cortes entreabertos da sua janela, calçou os chinelos:
macios, brancos e reconfortantes; vestiu o robe: cor de cetim; e percorreu o
quarto em direção à janela, abrindo-a, fazendo com que a luz do meio-dia que já
se fazia lá fora percorresse as paredes brancas, as flores brancas, os móveis
brancos, os tapetes brancos e todo o seu cabelo esbranquiçado pelo tempo,
deixando-a mascar com o olhar a saborosa paisagem que todos os dias tinha
cercada de si.
Quando
terminou de se preparar, desceu as escadas em direção a sala, quase aos
trambolhões, pois estas eram tão desconfortáveis que quando julgávamos estar a
descer uma já estávamos a descer três ou quatro; percorreu a sala em direção a
parte da cozinha, preparou uma chávena de chá, tomou o chá com um nico de pão,
fresco, que fora buscar ao armário, por arrumar, encostado a parede perto do
fogão onde tinha a xícara de chá, esfriada, pois fora feita no dia anterior, a
noite. Apressada pela falta de tempo, olhou o relógio que se encontrava no
outro lado da sala: depois do sofá e por cima da televisão; viu que o tempo não
a deixava respirar e pousou a metade do nico de pão em cima do sofá enquanto
corria escada acima em direção a casa de banho para dar os últimos retoques no
seu aprimorado exterior: penteando o seu cabelo clareado, escovando os dentes e
por fim descendo calmamente em direção ao exterior do prédio, dando-lhe tempo
para pegar novamente no nico de pão enquanto vestia o casaco.
(continua)